domingo, 3 de janeiro de 2010

O Trem

Falar sobre saudade em Pouso Alegre é sentar no "IBC" e ficar esperando o trem passar. Os trilhos desapareceram no tempo, ou foram engolidos pelo asfalto e a máquina partiu em definitivo para o interior de São Paulo. Por isso, a saudade é latente e andando pelo museu da cidade deparei-me com um passado que me tocou fundo no coração e encheu de lágrimas meus olhos.
O "IBC" perdeu-se pelos planos de desgovernos, já fabricou sapatos, e agora distribui alimentos para a cidade e região.
No museu só falta o trem!
Lá estão o telefone ainda de manivela, o sino da estação, o perfurador de passagens, o bagageiro, a placa da máquina e as fotografias; pois mesmo que o cérebro quisesse, somente as fotografias para trazerem de volta aquela falta de pressa da infância de nossa cidade.
O trem que ia levava a nossa produção agropecuária. Éramos uma cidade rural e a nossa economia baseava-se na terra quase exclusivamente. Mas o trem que vinha trazia da cidade grande notícias do progresso: - as grandes indústrias, o olhar assustado do caboclo que se perdeu entre os arranha-céus da metrópole.
Ah! Quanto a mente regrediu até chegar naquele tempo em que só o trem corria. As cercas guardavam as casas, seus medos e suas crenças. E o trem de ferro passava levando os suspiros das moças e os sonhos dos rapazes. Mas a criançada divertia-se nos trilhos, equilibrando-se nas linhas.
Na velha estação havia alvoroço pela chegada do trem. Era a moça esperando o noivo; a mãe esperando o filho; a banda esperando o político; o coroinha esperando o bispo; os soldados esperando o general.
Sempre que chegava, ele trazia consigo algo a somar ao progresso dessa terra, e quando partia levava em seus vagões um pedaço querido de nossos corações.
Até que um dia ele se foi para nunca mais voltar!
A cidade cresceu e quase todos se esqueceram do seu passar barulhento. O asfalto deitou-se sobre as linhas, sepultando para sempre o ranger de suas rodas. A estação emudeceu, e as pessoas, hoje, é que passam apressadas no vai e vem do comércio.
Vejo meu filho deliciar-se com as relíquias encontradas no museu. E pensar que cheguei a vê-las funcionando! Com certeza o levarei para conhecer a "Ponte de Ferro", uma grande peça desse glorioso passado, exposta ao ar livre. Sem me esquecer da estação da Imbuia, os dois pontos que limitavam o meu mundo de infância.
Seu eu quiser falar sobre saudade em Pouso Alegre...
Hoje, o trem que passa aqui é outro. Ele vem da eternidade e vai para o além... Leva em seus vagões, todos os dias, aqueles que já cumpriram a sua missão. Não é o trem das nossas lembranças. Mas é certamente, o do nosso destino.
Otail Santos de Oliveira - Pouso Alegre (MG) - 27 de Setembro de 1993.
2º Lugar do Literatura no FESPROVE 2009.

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